Esse estranho ser chamado Chefe
Max Gehringer
O bajulador e a arte do elogio
TODO MUNDO CONHECE ALGUÉM QUE PODERIA SER DEFINIDO,
tecnicamente, como bajulador. Ou, mais comumente, como
puxa-saco. Em latim, bajulus significa “carregador”. Durante
séculos, esse foi o nome dado ao empregado que retirava as
mercadorias dos navios e as transportava, nas costas, para
os armazéns do porto. Ou vice-versa. E aí chegamos ao
Brasil, no início do século XX. Como a maioria das
mercadorias que circulavam por nossos portos vinha
acondicionada em sacas, surgiu uma expressão mais popular
para a tarefa, “puxar sacos”. Assim como motoristas de
caminhão, até hoje, se referem a seu trabalho como “puxar
carga”. Portanto, “bajulador” e “puxa-saco” eram dois termos
muito positivos, usados para definir “um esforçado
trabalhador”. No Porto de Santos, os carregadores recebiam
por saca de café carregada, e sempre havia quem se
arriscasse a levar até cinco sacas nas costas – ou 300
quilos de uma só vez! - para melhorar um pouquinho o
salário. Mas no fim, como era de se esperar, o empregado
acabava ganhando uma miséria. Quem ficava com todo o lucro
era o patrão. E foi só uma
questão de tempo para que “bajular” e “puxar saco”
ganhassem a conotação pejorativa de “esforçar-se até o
limite extremo da resistência física, só para fazer a
felicidade do patrão”. Hoje em dia, nas empresas, o esforço
físico dos puxa-sacos foi substituído pela nobre arte de
elogiar o chefe. É verdade que o puxa-saco é um ser
desprezível, mas não se deve subestimá-lo. Assim como o
bajulador que mais puxava sacos era o que caía nas graças do
patrão, também o puxa-saco de hoje consegue, com sua
conversa fiada, o que bons funcionários não conseguem com
sua competência. E por que isso acontece? Porque nove entre
dez seres humanos adoram receber um elogio vazio. E chefes,
embora alguns não dêem essa impressão, também são seres
humanos.
Senta aí, Túlio!
TODA EMPRESA QUER TER UM AMBIENTE SAUDÁVEL DE TRABALHO. POR
isso, a empresa precisa saber o que se passa na cabeça de
seus funcionários. E há duas maneiras de fazer isso. Uma é a
Pesquisa de Clima, em que todos os funcionários são
convidados a responder se a temperatura na empresa está
fervendo ou se o relacionamento está gelado. A outra maneira
é uma cerimônia chamada Avaliação Anual. Nesse dia, o
funcionário senta na frente do chefe e diz tudo o que está
pensando sobre si mesmo, sobre a empresa e sobre o futuro.
Mas, para que um funcionário consiga se sair bem no dia da
Avaliação Anual, ele precisa saber dar a resposta certa. E a
resposta certa muda conforme o tempo passa. Aqui vai um
resumo de como funcionaram as Avaliações através dos tempos.
A década de 1970 ficou conhecida como Fase de Levantamento
de Expectativas, O funcionário entrava na sala do chefe e o
chefe falava “Senta aí, Túlio. Algum problema?”. E o Túlio
respondia: “Hã?”. E o chefe falava: “Certo, nenhum problema.
O próximo!”. A década de 1980 foi a Fase da Valorização do
Indivíduo. O chefe falava: “Senta aí, Túlio. Algum
problema?”. E o Túlio, que já sabia a resposta, dizia: “Não,
chefe”. E o chefe falava: “Como não? Tem, sim senhor! E nós
vamos traçar o seu perfil psicológico para descobrir qual
é”. A década de 1990 foi a Fase da Ênfase nos Resultados
Coletivos. O chefe falava: “Senta aí, Túlio. Algum problema?
“. E o Túlio, que já sabia a resposta, dizia: “Ah, sim,
vários”. E o chefe falava: “Não tem, não senhor. Nossa
última pesquisa mostrou que 97% dos funcionários estão
satisfeitos com a empresa. Se você é um dos 3% que não
estão, você não tem um problema. Você é um problema”. E
finalmente veio a década de 2000. A década do emprego
difícil e dos chefes estressados que querem tudo para ontem.
É a Fase do Todo Cuidado é Pouco. No dia da Avaliação Anual,
o funcionário entra na sala e o chefe diz: “Quem mandou você
sentar, Túlio?”.
Relacionamento, uma porta para o emprego
O concorrente mora ao lado
QUALQUER EMPRESA, DE QUALQUER TAMANHO E DE QUALQUER SETOR, sempre
sofre com uma praga chamada concorrência. Empresa
concorrente, como qualquer um sabe, é aquela que é pior que
a nossa, oferece produtos piores do que os nossos, tem
funcionários com nível inferior aos nossos, mas, por algum
motivo estranho e desconhecido, vende mais do que nós. Uma
coisa que eu aprendi na vida é que empresas inteligentes
sempre têm concorrentes de bom nível, enquanto as empresas
burras têm concorrentes ignorantes. Sempre que uma empresa
decide tratar o concorrente como um traste, ela pode esperar
pelo pior, porque a reação normal do desafeto será a de
partir para a ignorância. E, como se sabe, daí para frente
será o caos, porque dois ignorantes jamais chegam a um
acordo. Concorrentes são adversários, não são inimigos. Bons
concorrentes se ajudam no desenvolvimento do mercado,
através de produtos melhores, de inovações e de boas
campanhas. Maus concorrentes diminuem a qualidade e promovem
guerras de preço, achando que, assim, estarão prejudicando o
outro e não a si mesmos. Bons concorrentes cooperam entre
si, dentro dos limites legais e éticos. No caso dos
funcionários, a coisa funciona da mesma maneira.
Funcionários são seres humanos normais, que procuram o
sucesso pessoal. Para conseguir isso, terão que superar seus
concorrentes, que são os colegas que estão na mesa ao lado.
E aí, como enfrentar a concorrência de um colega? Os bons
concorrentes conversam. Os maus concorrentes se ignoram. Os
bons concorrentes se ajudam. Os maus concorrentes querem
prejudicar um ao outro. Bons concorrentes se entendem. Maus
concorrentes vivem se desentendendo. No mercado de trabalho,
ser bom não basta. O segredo é saber convencer os colegas
concorrentes de que somos melhores que eles, mas sem nunca
tentar mostrar que eles são piores do que nós.
A importância do networking interno
OUTRO DIA, EU RECEBI UMA LIGAÇÃO DE UMA PESSOA QUE TRABALHOU
comigo há dez anos. Vou chamá-lo de Airton, entre outras
coisas porque o nome dele é Airton. Eu deduzi que o Airton,
em teoria, queria saber como iam as coisas, porque ele me
perguntou: “Max, como vão as coisas?”. E eu respondi com
outra pergunta: “Quem está falando?”. Aí, o Airton me falou
o nome dele e eu não lembrei quem ele era. O Airton então me
disse que havia trabalhado comigo, e eu continuei não
lembrando. Lá pelas tantas, o Airton esclareceu que a gente
não tinha, assim, muito contato. E, finalmente, confessou
que nunca tínhamos nos encontrado pessoalmente, apenas
trabalhávamos na mesma empresa, mas em prédios diferentes. O
círculo de relacionamentos, ou networking, é uma das coisas
mais importantes hoje em dia. Em muitos casos, vale mais que
um currículo. A maioria imagina que fazer um networking é
conhecer gente de outras empresas. Na verdade, o bom
networking começa em casa, com as pessoas da própria
empresa. E muita gente que está empregada perde a chance de
fazer contatos com colegas dos quais poderá precisar daqui a
cinco, dez, quinze anos, e que estão ali, bem ao lado,
disponíveis para uma conversa. Esse relacionamento interno
não tem nada a ver com amizade nem com coleguismo, é apenas,
digamos assim, uma poupança profissional. Para que isso
funcione, é preciso que o funcionário se torne conhecido
dentro da empresa. Que circule por outros departamentos, se
apresente, converse, ajude, reparta informações. Se a outra
pessoa é simpática ou antipática, receptiva ou mal humorada,
não tem importância. O importante é fazer contato com todo
mundo, porque ninguém sabe quem estará onde daqui a alguns
anos. Pouca gente que está empregada percebe a importância
do networking interno. O Airton, por exemplo, não percebeu,
e só agora está descobrindo como vão as coisas. Sem uma boa
rede de relacionamento, as coisas não vão.
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