Saudações, Alvinópolis do
festival de música.
Por muito, muito pouco, eu
não precisei do auxílio de um médium pra escrever essa
coluna. Depois do segundo jogo do Galo contra o Tijuana,
eu contemplei a ideia de ter meus textos psicografados
pro Alvinews, pois achei que a casa estava
definitivamente caindo pro meu lado.
Eu imagino que a situação
no Ninho da Águia não deva ter sido muito diferente. E
tenho certeza de que, se a imprensa tivesse colocado
repórter de plantão no João XXIII, ia registrar 800
casos de ataque do coração. Mas pra mim foi especial
porque foi a primeira vez que eu fiquei RUIM, mas ruim
mesmo, em um jogo do Galo.
Ocorre que cheguei ao bar
da Dona Graça e não comi nada, com medo do jogo começar
e eu perder algum lance por estar catando milho e
batatinha palha que caiu do x-egg-bacon. O jogo foi
ficando tenso, e eu bebendo sem nem ver. Quanto mais
tenso, mais eu vou virando as long-necks de 10 reais
cada uma. E Dona Graça treinou as garçonetes pra ficarem
de olho na cerveja do povo: chegou perto do fundo da
garrafa, elas já oferecem outra. Igual garçom de
casamento. Dado o nível de tensão do jogo contra o
Tijuana, cê já imagina o quanto eu deixei ali naquele
bar, né? Só não deixei a calça porque não arrumei
ninguém ainda pra dar dinheiro naquilo.
Era uma noite de
temperatura agradável, e Dona Graça abriu a enorme porta
vertical na frente do bar... Aliás, como é o nome desse
tipo de porta? Aquelas de açougue, sabe? Que você joga
pra cima e ela enrola no teto? Pois é, tem uma dessas
lá, só que transparente. Estava fazendo um ventinho até
bom. Mas eis que se ouve o canto doce da RÔIA! Dois
caminhões de lixo param bem em frente ao bar, bem em
frente à portona aberta. Enquanto alguns lixeiros
pegavam o lixo da área toda, os outros foram ali perto
tomar um café. E o caminhão ficou ali, e a brisa levando
aquela maresia pra dentro do bar. O Tijuana dando um
vareio no Galo e o fedorzão do lixo acabando com a
torcida. Daí veio o pênalti e o bar ficou mudo. A única
frase que se ouvia era “Dona Graça, vê quanto deu a
minha aí?” Todo mundo pagando rápido pra poder sumir
dali. Eu lá, de crista na cabeça, olho na televisão e
mãos cobrindo a cara e especialmente o nariz, porque a
maré do caminhão estava de lascar o cano.
Quando Vitor defendeu
aquele pênalti, eu caí pra trás. Um cara atravessou as
quatro pistas da rua, ida e volta, sem olhar, pulando
com a bandeira do Galo. Depois da pulação e dos abraços,
eu fui pra varanda do bar, e fiquei ouvindo a Itatiaia
no celular e andando pra cima e pra baixo, rodando no
meio daquele cercadinho. Juntou a tensão, andar em
círculos com radinho na orelha, a crista do Galo dando
uma suadeira danada na minha cabeça, e o caminhão de
lixo que continuava de amargar... Quando notei que a
minha pressão estava despencando, só deu tempo de correr
pro banheiro, pra não dar trabalho pra ninguém. Ô ideia
fraca... O chão do banheiro parecia o Rio Arrudas. Cair
ali só me dava duas alternativas: ou eu morria da queda,
ou morria contaminado. Encostei na parede, branco igual
cera, e lembrei uma cena que vi no jornal uma vez, de um
cavalo que caíra dentro de uma fossa e um bombeiro
revoltado que teve que pular lá dentro pra ajudar a
salvar, enquanto a bombeirada toda rachava de rir. Na
hora eu só não sabia se eu era o cavalo ou o bombeiro,
mas a fossa já tava garantida. Aguentei de pé, mas ao
sair do banheiro naquela palidez, não escapei da
risaiada do povo, perguntando se eu tinha resolvido usar
a máscara do Pânico depois que o jogo acabou.
Bom, voltemos então a mais
essa viagem da bandeira viajante do Galo que comecei a
descrever na coluna do mês passado, como sempre em nome
do projeto MIDÁ O GALO DE PRATA (Momentos Inesquecíveis
Do Atleticano Objetivando Galo de Prata). Dessa vez, a
bandeira visitou Yellowknife, a capital canadense mais
próxima do Círculo Ártico. Uma viagem especial, pois ela
representa o propósito original do projeto: como contei
logo na minha primeira coluna no Alvinews, esse projeto
nasceu em uma conversa minha com Magela, tomando cerveja
no Ninho da Águia, e a ideia inicial àquela época era
simplesmente ir ao ártico com a bandeira.
Pois bem. Cheguei a
Yellowknife e já levei na testa. O meu grande erro foi
subestimar o turismo da cidade. Achei que ninguém era
doido de fazer turismo num lugar onde a temperatura ao
meio-dia, com sol, era de -20 graus, e à noite chegava a
-50. Ledo engano: o lugar fica lotado de japoneses. No
hotel, tudo era escrito em inglês e japonês. Tentei
andar de trenó de cachorro e pescar no gelo, mas já
estava tudo reservado há meses. No desespero pra fazer
alguma coisa diferente, tentei até alugar um
snowmobile (aquelas motos de andar no gelo), embora
não tenha o menor interesse em peste de snowmobile.
Mas nem isso eu consegui. Só me restou bater perna pela
rua, ver aquela turistada e refletir profundamente sobre
a pergunta eterna: por que turista japonês sempre tira
foto fazendo V com os dedos da mão?
Ah, mas à toa, eu não
fiquei. Ocorre que o grande evento anual da cidade
estava acontecendo exatamente naquele fim de semana: o
Festival da Ceroula! É sério, tô de sacanagem não. É o
Long John Jamboree, a celebração da ceroula de corpo
inteiro. Ceroulão lá é igual vaca na Índia, jovem. É
sagrado. Segundo o povo local, sem a ceroula, a vida
naquele cafundó é altamente mais ou menos. Achei
divertido e fui comprar uma pra mim, pra guardar de
lembrança, mas voltei no mesmo pé: R$ 350 por uma
ceroula? Mas nem se ela tiver braguilha com controle
remoto e isolamento acústico na parte de trás. Ô terra
das coisas caras. Sinto muito, mas encarei o frio com
cuecão da Lupo mesmo.
O festival acontece bem em
cima do lago congelado. Até o estacionamento do festival
é em cima do lago. É tranquilo, você nem nota... até
passar um caminhão do seu lado. Aí você escuta aquele
barulhinho de gelo trincando e a neurose começa. A
certeza de que aquela porcaria ia afundar comigo em
cima, e ainda chega um cara pra montar barraquinha de
quermesse onde eu estava. De que jeito se monta barraca
em cima do gelo? Rá! Igual acampar no mato: o elemento
levou a marreta no espeque da barraca e pá, pá, pá... A
marreta cantando, e o gelo trincando, e o vento
assoviando: “rôôôôia... rôôôia...” E não tenta correr
não, porque escorrega.
Entre as atrações do
festival, três campeonatos chamaram a atenção: o de
esculturas de gelo, o de corrida de trenó de cachorro,
e... o grande campeonato de deixar a barba crescer. É
sério, os caras tiram foto dois meses antes do dia do
festival, com a cara limpa. Chega no dia, quem tiver a
barba maior e mais doida ganha. Eu tirei foto dos dois
primeiros campeonatos. Desse da barba, nem cheguei
perto. É desaforo: o cara dá quase dois mil contos numa
passagem aérea pra chegar lá e ver barba? Eu cresci
brincando com Falcon, vendo Trinity na televisão,
Olivera na zaga do Galo e D. Pedro II nas notas de dez
cruzeiros. Caçar mais barba pra quê?
Mês que vem eu conto mais.
Não acabou não, viagem minha tem mais bomba que o quarto
de empregada do Bin Laden.
Apita Antônio Barcelos
Filho, errrrrrrrrgue os braços.
PS. O Luiz Agnelo é
alvinopolense e levou uma bandeira do Galo pra Lake
Louise, aqui no Canadá, e me enviou. Mais um
alvinopolense levando a bandeira do Galo pelo mundo.
Valeu Luiz.