Para falar ou escrever, usamos a palavra, principalmente, no
sentido literal. Mas não é raro a usarmos no sentido
figurado, buscando, assim, enfatizar coisas, fatos, etc..
Entre outras, uma forma que se usa é comparar a quantidade
de seres humanos reunidos dizendo tratar-se de "um
formigueiro humano".
Em viagem recente à Turquia, tivemos a oportunidade de
visitar, na região da Capadócia, uma cidade-museu, uma
cidade subterrânea.
Povos da era de 4.000 a.C. usavam estas cidades como meio de
moradia, em razão de indisponibilidade material para se
adquirir coisa melhor mas, principalmente, para se
defenderem, em tempos de guerra, dos ataques de salteadores
que, enfurecidamente, matavam, destruíam e roubavam. Além da
proteção pessoal, defendiam também seus pertences materiais
e animais. Essas moradias, às quais pudemos adentrar,
poderiam sim, serem chamadas de "um verdadeiro
formigueiro humano", com população numerosa construindo
sua cidade terra abaixo, para vida em comunidade.
Para nos situarmos quanto à localização, consideremos, na
região da Capadócia, um triângulo eqüilátero cujos lados
medem 80 km cada, e que tem nos vértices as cidades de
Nevsehir, Kayser e Nigde. Agora vamos inserir nesse
triângulo enorme, um bem menor cujos lados medem 20 km cada,
este sendo considerado a Capadócia turística.
Pois bem, ali é que foram construídas 36 aldeias-comunidade
subterrâneas, chegando, acreditem, a atingir 8 andares de
profundidade. As cidades subterrâneas eram divididas em
moradias, igrejas, escolas, padarias e chegaram a abrigar,
no caso da Derinkuyu, que visitamos, pasmem, até dez mil
pessoas.
A
região é formada pela sedimentação de cinzas vulcânicas que,
com o passar de milhares de anos, chegaram a uma dureza
aproximada da rocha, porém com condições de escavações. Para
se escavar, o primeiro passo era abrir um buraco vertical
para fluxo de oxigênio para sobrevivência dos escavadores e,
posteriormente, dos moradores. As moradias constavam de um
cômodo maior na entrada, para guarda e proteção dos animais,
a seguir um túnel no qual um ser de estatura mediana teria
que curvar-se para transpô-lo. Depois os cômodos que
serviriam para quartos, depósitos de gêneros alimentícios,
locais de fabricação de vinhos, azeites, depósitos de água,
etc. A cozinha era comunitária, atendendo a diversas
famílias, visando diminuir a quantidade de fumaça que
subiria pelas fornalhas, diminuindo também a possibilidade
de localização por quem estivesse no exterior. Faziam
perfurações (nichos) nas "paredes" onde eram colocadas
grisetas e lamparinas a azeite para a iluminação.
Quando estávamos visitando uma dessas aldeias, deparamo-nos,
em determinado local, com um túnel que, para transpô-lo,
tivemos de andar agachados e mesmo assim a cabeça raspava na
parte superior do mesmo. A finalidade deste túnel era para
se colocar a porta que era feita de pedra trazida da
superfície, chegava a pesar 500 kg e medir um metro de
diâmetro e 80 cm de espessura. Essa porta só poderia ser
aberta ou fechada por quem estivesse do lado de dentro,
aumentando, assim, a segurança na eventualidade de uma
localização por malfeitores.
Em época de paz, as aldeias eram utilizadas apenas como
dormitório mas, se surgisse época de violência, os
habitantes se trancafiavam e usavam os gêneros alimentícios
que foram armazenados para tal, com autonomia de até quatro
meses. Nessas circunstâncias, usavam cântaros enormes de
barro para se desfazerem dos dejetos. Quando pudessem voltar
à superfície, esvaziavam os cântaros.
A
importância da região da Capadócia, cujo significado na
antiga linguagem persa é "país de belos cavalos", não é só
pela história ou sua extraordinária paisagem, mas também por
ter sido um centro religioso a partir do século III de nossa
era. As comunidades cristãs perseguidas encontraram refúgio
e se estabeleceram fundando igrejas rupestres, não só dentro
do museu ao ar livre de Goreme, como nas cercanias, onde
também cavavam cidades subterrâneas. Em todas as igrejas há
afrescos representando cenas da vida de Cristo e do Antigo
Testamento.
Por se tratar de região de grande índice de abalos sísmicos,
não mais é permitido usar-se as Cidades Subterrâneas e
congêneres como moradia. O governo, visando a conservação
dessa riqueza arqueológica, bem como a sua exploração
turística, usa de recursos modernos como instalações
elétricas, iluminação, reforços em alvenaria, sem, contudo,
ameaçar sobremaneira a sua condição original.